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Lá vem o Brasil... Olha a ladeira, aí gente!

Por, Prof. Dra. Elaine dos Santos

Matéria Publicada em: 17/05/2018

Quando você está em uma universidade, o mundo fervilha! Quando você está em uma universidade federal e viaja diariamente, você encontra acadêmicos dos cursos de Educação, Psicologia, Odontologia, Agronomia, Enfermagem, Fisioterapia, Educação Física, Matemática e outros tantos, em pé, dentro de ônibus lotados, há uma gama infindável de assuntos para colocar em dia. Política, economia, saúde, educação, futebol, há um olhar crítico, altivo, cheio de conteúdo e argumentos sobre tudo, porque se lê sobre tudo, se busca informações sobre tudo e cada um traz o conhecimento da sua área, o seu ponto de vista. Assim, em meados dos anos 90, cursei a minha graduação. Era uma época em que não se comia waffer, barra de chocolate, mas se ingeria “alimento cariogênico”, definição, claro, vinda de uma futura dentista.

Esse preâmbulo serve para informar que, ao adentrar o mestrado, em 1999, eu sabia que existia um projeto de governo para investimento na educação em nível de pós-graduação “stricto sensu” (mestrado e doutorado), em virtude da aprovação da LDB 9394/96 e que, sim, era um propósito mostrar para o mundo que o Brasil tinha mão de obra qualificada. Nós éramos “um piloto” da moderna ciência brasileira. Cursei o mestrado, 1999/2000, como bolsista CAPES/CNPq e tinha, evidentemente, uma série de obrigações. Com um lastro de experiência no mundo acadêmico suficiente largo, fruto das fortes relações profissionais com os professores de literatura, eu sabia que o doutorado era para o longo prazo e que a atuação em cursos de graduação constituía uma exigência. Era-lhes, por outro lado, inadmissível que eu ministrasse aulas no ensino médio, ainda assim, para agradar os críticos de plantão, fiz concurso, fui aprovada e lecionei durante 10 anos letivos em escola pública. Uma experiência, deveras, interessante.

Fiz a seleção do doutorado em 2008, contudo, preparava-me desde 2006: publicação de artigos em revistas acadêmicas com classificação Qualis; participação em eventos com publicação de trabalhos completos desde que em eventos com ISSN/ISBN, palestras e conferências, tudo versando sobre o tema proposto para a tese de doutorado. As exigências CAPES haviam triplicado. No meu caso, aos 45 anos de idade, 30 anos de serviço efetivo (daqueles que constam na carteira de trabalho), poucas coisas ainda me assustavam; mas vi mestrandos e doutorandos (as turmas são mescladas) sofrerem, padecerem, chorarem, desesperarem-se com os critérios da pós-graduação “stricto sensu”, em cursos sérios (porque existem cursos “pistoleiros” obviamente!): você deixa de ter vida pessoal e mesmo profissional, você produz artigos, participa de eventos em sua área, organiza eventos com o seu orientador, participa de grupos de pesquisa, publica artigos em revista com classificação Qualis (no meu caso, para a qualificação da tese, eu deveria obrigatoriamente ter três artigos publicados em revista Qualis B3), passa pelo processo de qualificação da dissertação/tese diante de uma banca com professores doutores e corre o sério risco de ser reprovado. É quase uma insanidade, mas existe um objetivo claríssimo: formar profissionais de alto gabarito, a fina flor da intelectualidade nacional – SQN! Alguns cursos de pós-graduação estão formando “mecânicos”, gente que cumpre os créditos, não publica, são mestres e [pasmem] até doutores medíocres. Mas isso não é absolutamente nada!

Até pouco tempo, essa política que parece [e talvez seja] perversa tinha um propósito: formar profissionais de alto nível, de qualidade para atuarem, em vários campos do saber. No entanto, no atual governo, com o decréscimo das verbas para a educação, cada dia mais, a qualidade da formação ou mesmo o grau de engajamento das pessoas vem arrefecendo. Entre os meus colegas de mestrado e doutorado, quase todos são professores universitários na UNIPAMPA, na UFFS, na UFRGS, na UFSM, nos IFs... mas elas, as instituições de ensino superior, também vêm sofrendo grave redução de investimentos e o último plano nacional para a pós-graduação que propunha a formação do nosso primeiro concorrente a um Prêmio Nobel parece já estar engavetado. Triste realidade de um país que postula, agora, formar alunos de ensino médio na modalidade à distância, formar mão de obra má barata, que não seja capaz de reivindicar receber mais que um salário mínimo e que, principalmente, não tenha discernimento para reconhecer quando lhe são surrupiados os seus direitos mais elementares, colocando-se, por exemplo, frontalmente contra a defesa dos direitos humanos, esquecendo-se que são humanos também.

Prof. Dra. Elaine dos Santos

Revisora de textos acadêmicos / Palestrante

Contato e.kilian@gmail.com

Brito lateral 2020