Dias atrás, estive num desses centros comerciais que reúnem inúmeras lojas dos mais variados matizes. Impressionou-me que, faltando cerca de 40 dias para as chamadas festas natalinas, haja tantos pinheiros, tantas guirlandas, tantos enfeites com as cores daquele famoso refrigerante. Vender é preciso parece “gritar” aos quatro cantos um homem “enfiado” em roupas propícias para dias frios.
Coincidência ou não, o dia 25 de dezembro situa-se logo após o solstício de inverno no hemisfério norte (que ocorre, normalmente, entre os dias 21 e 23 de dezembro), região originária da dita festa. Após o solstício de inverno, os dias, aos poucos, aumentam, o sol fica visível durante mais tempo (o chamado “dia claro”), demonstrando que as trevas começam a serem vencidas pela luz – o chamado “Sol invicto”, que parecia morrer lentamente no céu, mas retoma o seu esplendor. O solo renasce, apto à plantação. Estou me referindo a um ritual pagão, que é anterior ao domínio do Império Romano sobre boa parte da Europa – guardadas as proporções, em junho, o mesmo “fenômeno” ocorria entre tribos da América do Sul: a saudação à natureza.
O Cristianismo, que se propagou, mais rapidamente, em função da expansão do Império Romano, adotou, na representação do nascimento de Jesus Cristo, a grande simbologia da vida: o Deus que se faz homem para salvá-lo do pecado, o Deus que entrega a própria vida para que os homens tenham vida – em abundância! Parece natural que se faça uma associação entre as datas: nasce a esperança em dias melhores.
O Natal não é, portanto, um grande pinheiro no meio da sala ou enfeites pendurados pelas portas, pelas sacadas. O Natal não é, portanto, um gigantesco e requintado presente, esquecido no dia seguinte ou que pode gerar discórdia, porque outros quereriam o mesmo mimo. O Natal não é, portanto, um comércio movimentado com pessoas acotovelando-se em busca do melhor preço, do produto que possa satisfazer-lhes os desejos (ou suprir-lhes o vazio existencial). Mesmo ateus e agnósticos, hoje em dia, entendem que o Natal é uma oportunidade para estar próximo aos familiares ou aos amigos, enfim, àqueles que nos fazem bem. Compreende-se o Natal como um momento de repensar atitudes, pedir perdão, reconhecer erros ou transgressões, ser solidário, ser generoso.
As roupas do “Pai Natal” (Noel, vocábulo de origem francesa, significa justamente “pai”), as renas, o trenó, se você pensar bem, não combinam com o calor brasileiro. Num mundo pautado por tanta violência, por tanto ódio, por tanta discórdia, seria pertinente que as comemorações pagãs ou espírito cristão tomassem o lugar do comércio, da objetificação dos sentimentos. Afinal, amar não tem preço.
Professora Doutora Elaine dos Santos
Autora do livro “Entre lágrimas e risos: as representações do teatro mambembe no teatro itinerante”, que conta a história do Teatro Serelepe.