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Culpa ou Inocência?

Por, Guilherme Kuhn | Advogado Criminalista.

Matéria Publicada em: 25/10/2021

É muito comum que as pessoas se refiram a Advocacia Criminal como sendo uma profissão caracterizada pela dor, pelo sofrimento, pela angústia, pela tragédia, pela perda etc. Alguns, inclusive, a definem como a geografia da dor.

Eliézer Rosa já dizia que tudo na Advocacia Criminal é dor e desespero. Os próprios triunfos têm seu tanto de amargor, porque, enquanto pende o processo e se prepara a causa, há sofrimentos que, sequer, absolvição do réu é capaz de apagar completamente.

Os profissionais que militam na seara criminal trabalham, assim, diariamente, com o desespero humano, convivendo com pessoas que, por alguma manobra do destino, sofrem por terem sido vítimas de um crime ou, então, sofrem por estarem sendo acusadas – justa ou injustamente – de ter cometido um delito.

Em meio a esse turbilhão de emoções, de expectativas, de ódio, de amor, de esperanças e desesperanças, estão esses profissionais – assim como estão os médicos em meio a uma cirurgia de risco, onde a vida do paciente depende do êxito do procedimento -, cada um cumprindo o seu papel. E que bom que assim possa ser. Que bom que exista um Delegado de Polícia que tenha a sua autonomia profissional e a sua convicção; que bom que existem Promotores de Justiça, cada um com o seu posicionamento; que bom que existem juízes, alguns mais duros, outros mais brandos; e que bom que existem os Advogados para defender as pessoas que são acusadas – justa ou injustamente – de cometer um crime.

Quando um Advogado discorda de uma Autoridade Policial, de um Promotor de Justiça ou de um Juiz, e vice-versa, isso não significa que se está desrespeitando a dor dessas pessoas, mas simplesmente que existem profissionais sérios, normalmente extremamente dedicados e combativos, trabalhando. Significa que estamos num processo democrático: onde os profissionais são livres para divergir, para discutir, para argumentar, para expor o seu entendimento, para manifestar o seu pensamento, a sua opinião, agrade às pessoas ou não. Cada um no seu papel.

O psicodrama explica a importância dos papéis. Toda vez que existir um papel, necessariamente, deverá existir um contra papel. É o que Jacob Levy Moreno já dizia: o Eu se forma a partir da existência do outro. Por exemplo: há o papel de filho e o contra papel de mãe, o contra papel de pai, de avó, de irmão. O “Eu”, assim, é resultado dos papéis e contra papéis que surgiram durante a vida.

Todos exercemos papéis, mesmo sem perceber. Uma pessoa, ao caminhar na rua, exerce o papel de pedestre. Uma criança, o papel de criança. O condutor de um veículo, o papel de motorista etc.

No processo criminal, assim, para o papel de Promotor de Justiça, há o contra papel do Advogado; para o papel de Advogado, há o contra papel do Promotor de Justiça e, no meio de tudo isso, um juiz, que irá decidir a causa a partir do resultado desta soma de papéis, exercendo o papel de julgador – espera-se – imparcial. A existência de uma defesa forte, a divergência, as discussões no decorrer da causa são salutares para que, ao final do processo, seja atingido um resultado justo.

Pois é neste exercício de papéis e contra papéis que, não raro, surgem ao Advogado Criminalista afirmações falaciosas, como: “O Advogado Criminalista só defende bandido!”

Trata-se da velha guerra moral existente entre: culpa ou inocência!?

Não. O Advogado Criminalista não defende bandidos, não defende cidadãos de bem ou de mau, de esquerda ou de direita. O Advogado defende pessoas.

A pessoa que está sendo o acusada, o réu, quando está sentado sob o “banco dos réus”, não está ali por ser culpado. Ele está ali, sob o “banco dos réus”, exatamente para ser julgado, para que o Poder Judiciário possa decidir se a acusação criminal está correta ou não, se ela é verdadeira ou falsa e se o sujeito é culpado ou inocente.

A mensagem que fica é: nem todo mundo é bom ou mau; nem todo mundo é santo ou completo demônio. Não há coisa inteiramente má. E, enquanto o sujeito não for julgado, não importa quem seja, a cor da pele, a sua aparência, o seu nome, o seu passado, a sua conta bancária etc., deve ser presumido e tratado como inocente.

Portanto, repito: o Advogado não defende bandido. Ele defende pessoas. Ele exerce o seu papel, afinal, não há causa criminal indigna de defesa.

Cuidado, muito cuidado, mas muito cuidado mesmo com a verdade e com o discurso do bem e do mal. Afinal, reiterando as palavras de Mário Quintana:

“Do bem e do mal

Todos têm seu encanto: os santos e os corruptos

Não há coisa na vida inteiramente má.

Tu dizes que a verdade produz frutos…

Já viste as flores que a mentira dá?”

A Advocacia Criminal não é a geografia da dor, a profissão caracterizada somente pela perda e pelo sofrimento. Ao contrário: ela é a profissão da esperança.

Por, Guilherme Kuhn

Advogado Criminalista.

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